quinta-feira, 14 de abril de 2011

Perdida

Ela tinha duas sensações temporais completamente distintas, parecia haver dois relógios contando o tempo ao seu redor. O primeiro era o que contava o tempo daquela sala, onde ela tinha que cumprir as oito horas de trabalho que pouco lhe interessava, esse passava muito devagar, e ela podia ouvir o barulho dos ponteiros se movendo em câmera lenta, as vezes ia tão devagar que parecia que tinha parado, era tanto tempo ali dentro, que ela não sabia o que fazer com ele naquele espaço pouco criativo.


Enquanto isso o segundo relógio contava o tempo de todo o resto do mundo, de tudo que acontecia pra fora daquela sala, os minutos mudavam como os segundos, e ela só enxergava a luz do display, rápida, enquanto eles trocavam. O mundo todo produzia informação na velocidade do segundo relógio, e ela simplesmente não conseguia entender como eles conseguiam, como podia tanta coisa acontecer ao mesmo tempo, e todo mundo absorvendo aquela massa de novidades a cada instante, ela se sentia uma incapacitada por não dar conta, por se perder, como se todos os outros tivessem nascido com aquela habilidade, que havia sido negada à ela.

Além desses dois, havia também um terceiro marcador de tempo, que ela tinha dificuldade até de chamar de relógio. Esse não marcava o tempo externo, apenas o interno. Marcar, também pode não ser o termo, era difícil contabilizar o que ocorria nessa dimensão, ali o tempo parecia não ter uma sequência normal, não era muito rápido, nem muito devagar, era uma mistura de passado, presente e futuro. Seu passado parecia ecoar a todo tempo, querendo ditar padrões para o futuro, mas nenhum dos dois estavam acontecendo. O presente parecia uma falha no sistema, uma caminho errado entre o passado e o futuro. A mistura das lembranças com as projeções fazia com que o presente parecesse irreal,era abstrato demais pensar no agora, com tanta coisa acontecendo em todos os outros momentos.

Parecia demais para ela convergir todas os seus três tempos, era como se estivesse no limbo.Não adiantava tentar confiar naquele um minuto mostrado por números em um relógio REAL preso na parede. Ao passar podia representar um profundo vazio de atividades, um milhão de informações novas espalhadas pelo mundo, além de opniões, idéias, reclamações, e uma série de atos que aconteceram e que iriam acontecer. A dimensão tempo nunca pareceu tão ilógica, era tempo do corpo, o tempo da mente e o tempo do mundo. Conseguiu resumir o seu maior problema em uma pergunta: como fazer para funcionarem juntos?